É inegável que a imprensa tem cumprido, em parte, seu dever de "guardiã da sociedade", fiscalizando ostensivamente os desvios (éticos e financeiros) do Congresso Nacional. O problema se dá no direcionamento proposital das denúncias.
O verdadeiro fuzilamente que Sarney vem sofrendo da grande imprensa é, por um lado, justificável. Afinal, o presidente do Senado está intimamente ligado aos atos secretos, tem parentes vivendo às custas do dinheiro público, recebeu auxílio-moradia de R$3,6 mil por mês "sem que soubesse", não declarou mansão de R$ 4mi ao Tribunal Eleitoral, e levou um duro golpe com as recentes denúncias de desvio de verbas que a Fundação Sarney recebeu da Petrobrás (de acordo com o ESTADAO, dos R$1,3 mi repassados pela Petrobrás, ao menos R$ 500 mil foram para empresas fantasmas ou de firmas da família Sarney - veja matéria aqui).
São louváveis as denúncias que a imprensa tem promovido, bem como o trabalho investigativo da mesma. Escândalos e desvio de conduta dos nossos políticos não devem ser tratados com piedade. O problema é que só determinados parlamentares, selecionados a dedo pela grande imprensa, sofrem esse massacre.
Peguemos a denúncia envolvendo a Fundação Sarney, por exemplo. É mais do que merecido que Sarney sofra investicações e arque com as consequências (inclusive pode perder o mandato, já que quebrou o decoro parlamentar ao mentir, dizendo que não é responsável pela Fundação - ele é o presidente vitalício). Mas a imprensa poderia aproveitar a pauta e investigar outros casos semelhantes.
O Instituto Fernando Henrique Cardoso (iFHC) angariou em 2002 R$ 5,7 mi para digitalizar o acervo do ex-presidente com incentivos fiscais da Lei Rounet (mesma aritimanha utilizada por Sarney para obter recursos da Petrobrás). A denúncia é do blog "Os amigos do Presidente Lula", que, apesar de ser claramente petista (o próprio nome já elucida), faz ótimas matérias investigativas. O que faz a imprensa dar tanto destaque às falcatruas de Sarney, mas não emitir sequer uma nota sobre o caso semelhante envolvendo o ex-presidente do PSDB?
Outro exemplo da partidarização da grande mídia é o senador Arthur Vigílio (PSDB-AM). O amazonense é o queridinho da imprensa, sempre tendo matérias a seu favor (ressaltando a sua "excelente oposição" ao governo Lula e levando o público a crer que é um baluarte da ética no Senado). Mas a história não é exatamente essa.
Os grandes veículos só destacam as denúncias que Virgílio faz de Sarney e dos atos secretos, mas não dão atenção ao fato de que o próprio tucano tem negócios escusos no Senado. Uma excelente e imperdível análise disso fez Luis Nassif em seu blog - veja aqui.
Mas o episódio que me motivou a escrever nessa fria tarde jauense não tem nada a ver com o Congresso. O Estadão de hoje trouxe, na página 8 do caderno Nacional, a seguinte manchete: " 'Quero fazer justiça ao Collor', diz Lula, ao elogiar o ex-presidente ".
A frase, retirada de seu contexto, leva o leitor a crer que Lula quer defender Collor (atualmente senador pelo PTB) do impeachment que o ex-presidente alagoano sofreu em 1992, após inúmeras denúncias de corrupção. A matéria também afirma, no primeiro parágrafo, que Lula comparou Collor ao ex-presidente Juscelino Kubitschek (considerado um dos melhores presidentes brasileiros). A matéria completa está aqui.
O leitor mais desavisado pode ser levado a crer que Lula enlouqueceu e resolveu andar de mãos dadas com um de seus maiores desafetos políticos (que o derrotou nas eleições de 1989, ocasião na qual o programa eleitoral de Collor veiculou denúncias de baixo nível para atingir o petista). Mas o discurso, na íntegra, desmente o jornal da família Mesquita. Veja abaixo:
Fica claro que Lula, ao dizer que "quer fazer justiça ao Collor", está se referindo ao fato do alagoano integrar a base aliada de Lula no Senado. E sua comparação a JK se deve por ambos terem visitado o Maranhão quando presidentes da República. O próprio Estadão elucida isso no decorrer da matéria, mas quem ler apenas a manchete e o lead terá outro entendimento.
Não vou entrar na questão política de Lula estar no mesmo palanque de Collor (já que nosso presidente petista há muito jogou ao ar suas convicções éticas para se tornar um político pragmático, fazendo aliança até com o Diabo para manter a tão chamada "governabilidade" no Congresso). O fato é que o Estadão tirou frases de Lula de seu contexto original, dando outros sentidos a elas.
Estes são só alguns exemplos de como a imprensa veicula certos fatos. Ao contrário de vários blogs (nitidamente maniqueístas - "PT é o céu e o PSDB o inferno", e vice-versa) acredito que não há mocinhos em nossa política nacional (claro, sempre há raras exceções). O problema é que a mídia escolhe a dedo quem será o massacrado da vez, favorecendo alguns políticos (e partidos) em detrimento de outros. É ela a detentora do poder de manipular o público, veiculando apenas a parte que lhe convém da história.
É esse o argumento que muitos militantes políticos utilizam para descredibilizar as denúncias da imprensa. Afinal: meias verdades são grandes mentiras. Certo? Não.
O direcionamento das críticas da imprensa é condenável, mas as denúncias, em grande parte, são comprovadas. Não é porque a mídia diliberadamente oculta fatos dos políticos com os quais simpatiza que os escândalos envolvendo os demais parlamentares devem ser esquecidos. O fato de só a Fundação Sarney ser manchete - enquanto o iFHC permanece imune - não é motivo para centramos toda nossa crítica à imprensa e esquecermos das denúncias pela mídia reveladas.
As meias verdades da imprensa não devem ser desqualificadas, mas sim investigadas, pois de fato são reais. Em contrapartida, a própria mídia deve ser pressionada para que seja mais honesta na veiculação das matérias. Vale novamente ressaltar: não há mocinhos nessa história.
quarta-feira, 15 de julho de 2009
sexta-feira, 10 de julho de 2009
Governabilidade em detrimento da ética
A perene crise que assola o Senado e, em maior dosagem, o presidente da Casa, José Sarney (PMDB), colocou o PT em verdadeira saia justa. As denúncias envolvendo o ex-presidente da República (sendo a mais recente o desvio dos recursos cedidos pela Petrobrás à Fundação Sarney) exaltaram os ânimos no Senado.
Três partidos pressionam pela renúncia ou o afastamento de Sarney da presidência: DEM, PSDB E PDT. Juntos, somam 32 senadores. A esse grupo inclui-se Jarbas Vasconselos e Pedro Simon, as poucas exceções éticas do PMDB, e o também pemedebista Garibaldi Alves. Há também José Nery, único representante do PSOL na Casa. O saldo é este: 36 Senadores não compactuam com Sarney sentado na cadeira de presidente.
É óbvio que cada um tem seus interesses.
O DEM, por exemplo, foi o principal fiador da eleição de Sarney. Foram os 14 senadores do partido que possibilitaram a vitória do candidato do PMDB sobre Tião Viana, do PT, no início do ano. Além disso, Sarney tem fortes vínculos com o partido, desde o tempo em que este ainda era PFL. O DEM, agora, tenta tirar o corpo fora, jogando todo o peso da culpa sobre o presidente. Mas esse ato de traição vai mais além: é o partido quem comanda a primeira secretaria, apelidada de "cofre da Casa". Ou seja: querem usar Sarney como bode expiatório para todos os devios que o próprio partido ajudou a cometer.
Já o PSDB, além de exercer seu papel de oposição, tem outros interesses no afastamento de Sarney. O primeiro vice-presidente da Casa é, vejam só, o tucano Marconi Perillo. Se Sarney de fato se afastar, a presidência cairá de mão beijada nas mãos do PSDB. Caso renuncie, Perillo teria 5 dias para marcar novas eleições. O que a mídia não dá atenção é que trocar Sarney pro Perillo, do ponto de vista moral, é como substituir seis por meia dúzia. O tucano é alvo de quatro inquéritos no Supremo Tribunal Federal por supostos crimes cometidos quando era governador de Goiás. As acusações que recaem sobre ele deixam até Sarney no chinelo: formação de quadrilha, corrupção passiva e fraude em licitações.
Sobre Pedro Simon e Jarbas Vasconselhos não há críticas a fazer. Ambos, há tempos, têm se mostrado as raras exceções éticas no Senado e no PMDB. Já Garibaldi Alves, não é crime supor, tem como um dos motivos para pedir o afastamento o fato de ele mesmo ter sido preterido por Sarney para disputar as eleições presidenciais no início do ano (vale recordar que Garibaldi cumpriu um mandato tampão na presidência após a renúncia de Renan Calheiros).
Vamos, finalmente, ao PT. O Partido dos Trabalhadores, a mando de Lula, deixou claro que não é mais o baluarte da ética de tempos atrás.
Quando a crise estourou pra cima de Sarney, sete dos doze senadores do partido estavam inclinados a pedir o afastamento do presidente. Eis que Lula apareceu e deixou claro quem manda no partido. O presidente, então em viagem à Líbia, reafirmou seu apoio incondicional a Sarney. Até a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, foi escalada para proteger o senador.
Nos bastidores, Lula chamou sua bancada de senadores de "amadores" e ordenou o apoio a Sarney.
Pouco depois, o plenário assistiu a um visivelmente contrariado Aloizio Mercadante, líder do partido no Senado, defender Sarney na tribuna. Em sua fala, um verdadeiro desabafo do que levou o partido a cessar as críticas ao presidente da Casa:
Mercadante deixa claro o que levou o PT a reafirmar o apoio a Sarney. A frase já é clichê, mas não resisto à tentação de utilizá-la: o PT virou refém do PMDB.
No Senado, além da presidência, o PMDB possui 18 senadores. Um número extremamente valioso para que projetos de interesse do governo sejam aprovados e, acima de tudo, para barrar a oposição em questões danosas ao Planalto. Mas nem toda a bajulação que o PT faz ao PMDB impede que o aliado tome decisões contrárias aos interesses governamentais (a extinção da CPMF é o principal exemplo).
Além disso, temos as eleições de 2010. O maior temor do PT é que o PMDB apóie um candidato tucano (seja o paulista José Serra ou o mineiro Aécio Neves). Assim, o melhor aos petistas é não causar atritos com os pemedebistas.
Fora tudo isso, há o fato de, se Sarney se afastar, o PSDB ganhar a presidência do Senado.
Somando tudo, duas análises são cabíveis:
A primeira tem como parâmetro o âmbito político. Nesse quesito, não há como criticar a atitude do PT e, sobretudo, a de Lula. Politicamente falando, não há outra opção ao PT que não seja apoiar Sarney na presidência. Cai como uma luva o velho ditado: "Ruim com ele, pior sem ele". Seria nada menos que desastroso para o Planalto que um tucano presidisse o Senado em vésperas de eleições. Pior ainda seria não contar com o apoio da bancada do PMDB na obstrução das investigações da interminavelmente adiada CPI da Petrobrás (que, ao que parece, finalmente será instaurada na próxima terça-feira). Ou, em caso catastrófico, perder o apoio do partido para o PSDB. Assim, Lula tem razão ao qualificar de amadora a incipiente decisão da sua bancada de senadores de pedir o afastamento de Sarney. A imprensa tem afirmado que Lula, com toda sua popularidade, não precisa de ninguém para ter a governabilidade. Bobagem. Os 80% de aprovação popular que Lula detém de nada lhe ajudam na aprovação de projetos no Congresso.
Tendo a ética como parâmetro, porém, a atitude de Lula é decepcionante. O que dizer de alguém que 1989 não poupava críticas ao remanescente da ditadura (Sarney), e que agora lhe dá todo o apoio possível. Lula poderia dar um tácito apoio ao aliado, sem ter que passar por constragimentos, como quando argumentou que "Sarney, devido a sua biografia, não é um cidadão comum" e por isso não deveria ser julgado pela crise do Senado. É óbvio que a crise não é culpa exclusiva de Sarney, tampouco que seu afastamento irá mudar algo, mas essa defesa apaixonada que Lula faz (e obriga o PT a fazer) de Sarney tem decepcionado muito militante e simpatizante do partido. É de dar pena a desolação de Mercadante no discurso que postei acima.
É claro que nem todos do partido acataram a ordem de Lula. Os senadores Eduardo Suplicy, Marina Silva (ex-ministra do meio ambiente) e Tião Viana (que perdeu para Sarney as eleições no início do ano) continuam pedindo o afastamento do pemedebista. Mas são vozes solitárias, abafadas pelo coro partidário.
A partir de agora, o PT não irá pressionar Sarney, mas também não irá se expor na defesa do presidente do Senado. Irá agir tacitamente para mantê-lo na presidência. É uma pena que o partido, mais uma vez, tenha decidido pela governabilidade em detrimento da ética.
Três partidos pressionam pela renúncia ou o afastamento de Sarney da presidência: DEM, PSDB E PDT. Juntos, somam 32 senadores. A esse grupo inclui-se Jarbas Vasconselos e Pedro Simon, as poucas exceções éticas do PMDB, e o também pemedebista Garibaldi Alves. Há também José Nery, único representante do PSOL na Casa. O saldo é este: 36 Senadores não compactuam com Sarney sentado na cadeira de presidente.
É óbvio que cada um tem seus interesses.
O DEM, por exemplo, foi o principal fiador da eleição de Sarney. Foram os 14 senadores do partido que possibilitaram a vitória do candidato do PMDB sobre Tião Viana, do PT, no início do ano. Além disso, Sarney tem fortes vínculos com o partido, desde o tempo em que este ainda era PFL. O DEM, agora, tenta tirar o corpo fora, jogando todo o peso da culpa sobre o presidente. Mas esse ato de traição vai mais além: é o partido quem comanda a primeira secretaria, apelidada de "cofre da Casa". Ou seja: querem usar Sarney como bode expiatório para todos os devios que o próprio partido ajudou a cometer.
Já o PSDB, além de exercer seu papel de oposição, tem outros interesses no afastamento de Sarney. O primeiro vice-presidente da Casa é, vejam só, o tucano Marconi Perillo. Se Sarney de fato se afastar, a presidência cairá de mão beijada nas mãos do PSDB. Caso renuncie, Perillo teria 5 dias para marcar novas eleições. O que a mídia não dá atenção é que trocar Sarney pro Perillo, do ponto de vista moral, é como substituir seis por meia dúzia. O tucano é alvo de quatro inquéritos no Supremo Tribunal Federal por supostos crimes cometidos quando era governador de Goiás. As acusações que recaem sobre ele deixam até Sarney no chinelo: formação de quadrilha, corrupção passiva e fraude em licitações.
Sobre Pedro Simon e Jarbas Vasconselhos não há críticas a fazer. Ambos, há tempos, têm se mostrado as raras exceções éticas no Senado e no PMDB. Já Garibaldi Alves, não é crime supor, tem como um dos motivos para pedir o afastamento o fato de ele mesmo ter sido preterido por Sarney para disputar as eleições presidenciais no início do ano (vale recordar que Garibaldi cumpriu um mandato tampão na presidência após a renúncia de Renan Calheiros).
Vamos, finalmente, ao PT. O Partido dos Trabalhadores, a mando de Lula, deixou claro que não é mais o baluarte da ética de tempos atrás.
Quando a crise estourou pra cima de Sarney, sete dos doze senadores do partido estavam inclinados a pedir o afastamento do presidente. Eis que Lula apareceu e deixou claro quem manda no partido. O presidente, então em viagem à Líbia, reafirmou seu apoio incondicional a Sarney. Até a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, foi escalada para proteger o senador.
Nos bastidores, Lula chamou sua bancada de senadores de "amadores" e ordenou o apoio a Sarney.
Pouco depois, o plenário assistiu a um visivelmente contrariado Aloizio Mercadante, líder do partido no Senado, defender Sarney na tribuna. Em sua fala, um verdadeiro desabafo do que levou o partido a cessar as críticas ao presidente da Casa:
Mercadante deixa claro o que levou o PT a reafirmar o apoio a Sarney. A frase já é clichê, mas não resisto à tentação de utilizá-la: o PT virou refém do PMDB.
No Senado, além da presidência, o PMDB possui 18 senadores. Um número extremamente valioso para que projetos de interesse do governo sejam aprovados e, acima de tudo, para barrar a oposição em questões danosas ao Planalto. Mas nem toda a bajulação que o PT faz ao PMDB impede que o aliado tome decisões contrárias aos interesses governamentais (a extinção da CPMF é o principal exemplo).
Além disso, temos as eleições de 2010. O maior temor do PT é que o PMDB apóie um candidato tucano (seja o paulista José Serra ou o mineiro Aécio Neves). Assim, o melhor aos petistas é não causar atritos com os pemedebistas.
Fora tudo isso, há o fato de, se Sarney se afastar, o PSDB ganhar a presidência do Senado.
Somando tudo, duas análises são cabíveis:
A primeira tem como parâmetro o âmbito político. Nesse quesito, não há como criticar a atitude do PT e, sobretudo, a de Lula. Politicamente falando, não há outra opção ao PT que não seja apoiar Sarney na presidência. Cai como uma luva o velho ditado: "Ruim com ele, pior sem ele". Seria nada menos que desastroso para o Planalto que um tucano presidisse o Senado em vésperas de eleições. Pior ainda seria não contar com o apoio da bancada do PMDB na obstrução das investigações da interminavelmente adiada CPI da Petrobrás (que, ao que parece, finalmente será instaurada na próxima terça-feira). Ou, em caso catastrófico, perder o apoio do partido para o PSDB. Assim, Lula tem razão ao qualificar de amadora a incipiente decisão da sua bancada de senadores de pedir o afastamento de Sarney. A imprensa tem afirmado que Lula, com toda sua popularidade, não precisa de ninguém para ter a governabilidade. Bobagem. Os 80% de aprovação popular que Lula detém de nada lhe ajudam na aprovação de projetos no Congresso.
Tendo a ética como parâmetro, porém, a atitude de Lula é decepcionante. O que dizer de alguém que 1989 não poupava críticas ao remanescente da ditadura (Sarney), e que agora lhe dá todo o apoio possível. Lula poderia dar um tácito apoio ao aliado, sem ter que passar por constragimentos, como quando argumentou que "Sarney, devido a sua biografia, não é um cidadão comum" e por isso não deveria ser julgado pela crise do Senado. É óbvio que a crise não é culpa exclusiva de Sarney, tampouco que seu afastamento irá mudar algo, mas essa defesa apaixonada que Lula faz (e obriga o PT a fazer) de Sarney tem decepcionado muito militante e simpatizante do partido. É de dar pena a desolação de Mercadante no discurso que postei acima.
É claro que nem todos do partido acataram a ordem de Lula. Os senadores Eduardo Suplicy, Marina Silva (ex-ministra do meio ambiente) e Tião Viana (que perdeu para Sarney as eleições no início do ano) continuam pedindo o afastamento do pemedebista. Mas são vozes solitárias, abafadas pelo coro partidário.
A partir de agora, o PT não irá pressionar Sarney, mas também não irá se expor na defesa do presidente do Senado. Irá agir tacitamente para mantê-lo na presidência. É uma pena que o partido, mais uma vez, tenha decidido pela governabilidade em detrimento da ética.
domingo, 5 de julho de 2009
De quem é a crise
Nas últimas semanas, a retumbante crise que aflige o Senado personificou-se na figura do presidente da Casa, o senador José Sarney (PMDB-AP). Aos desavisados, segue uma breve retrospectiva:
Sarney passou a presidir a instituição pela terceira vez (já o havia feito de 1995 a 1997 e entre 2003 e 2005) no início deste ano. Desde então, escândalos como o das passagens aéreas, do pagamento de horas extras a servidores durante as férias e do seguro de saúde (após seis meses no cargo, o senador e seus familiares são agraciados com um seguro de saúde vitalício, onerando anualmente dos cofres públicos R$17 milhões) vêm palpitando na imprensa. Mas foram os atos secretos que escancararam o tamanho da podridão que assola o Senado.
Foi a partir de então que a crise, que era da instituição como um todo, passou a ser catalisada na figura de Sarney. Fora ele quem, durante sua primeira presidência da Casa, contratou Agaciel Maia para diretor geral do Senado e João Carlos Zoghbi para diretor de recursos humanos da instituição. Desde então, os dois montaram um esquema que permitia, dentre outros, a contratação secreta de funcionários e aumento salarial (clique aqui e veja exemplo). Apelidado de "atos secretos" o esquema servia também para exonerar, sem publicidade, parentes dos senadores lotados em cargos políticos (o que configura como nepotismo cruzado). Exemplo disso é o irmão de José Sarney, Ivan Celso Furtado Sarney, exonerado do cargo de assistente parlamentar, e João Fernando Michels Gonçalves Sarney, neto do presidente, exonerado do gabinete do senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA); ambos por ato secreto.
Pouco depois, foi descoberto que Adriano Cordeiro Sarney, outro neto de Sarney, operava um sistema de crédito consignado no Senado. Por meio da empresa Sarcris Consultoria, Serviços e Participação Ltda., Adriano intermediava a concessão de empréstimo de seis bancos aos servidores da Casa.
A situação complicou para Sarney após a recente denúncia de que ele não declarou à Justiça Eleitoral uma casa no valor de 4 MILHÕES DE REAIS. Sarney comprou a casa em 1997 do banqueiro Joseph Yacoub Safra, dono do Banco Safra. Desde então, disputou duas eleições (1998 e 2006) sem declará-la. O artigo 350, presente no capítulo 2 Código Eleitoral, classifica como crime eleitoral "Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais.”
Eis a mansão:
Foi justamente por não declarar à Justiça uma mansão, no valor de R$ 5 milhões de reais, que Agaciel Maia foi afastado do cargo de diretor geral do Senado (antes mesmo do escândalo dos atos secretos vir à tona).
A mansão não declarada de Sarney é sua residência em Brasília. Mesmo assim, de 2008 a maio deste ano Sarney recebia R$3,8 mil mensais de auxílio-moradia, destinado aos parlamentares que não possuem residência fixa na capital. Ou seja: além de não declarar a mansão, Sarney ainda recebia um auxílio (equivalente a mais de 7 salários mínimos) por supostamente não morar em Brasília.
Apesar de tudo isso, Sarney declarou: "A crise não é minha". Veja abaixo trechos do discurso, feito em 16/06 na tribuna do Senado:
José Sarney está certo. Por ter presidido três vezes o Senado, ele tem a maior parcela de culpa de toda essa crise. Afinal, foi ele quem trouxe Agaciel Maia, Zoghbi, entre outros, e aparelhou a Casa de modo a possibilitar todo e qualquer desvio de ética. Porém, não deve ser crucificado sozinho pelas recentes denúncias, tampouco ser nomeado o responsável pelo sangramento do Senado. Afinal, o Senado está ferido há tempos.
Somente de 2000 para cá, foram inúmeros escândalos e dois presidentes renunciaram. Em 2001, o então presidente do Senado Jáder Barbalho (PMDB) renunciou após denúncias de corrupção e desvio de verbas, que somavam mais de R$ 3 bilhões. Em 2007, Renan Calheiros (PMDB-AL) deixou a presidência após a revelação de que pagava a pensão do filho que teve com a ex-amante Monica Veloso com dinheiro de um lobista de uma empreiteira.
Portanto, Sarney não é o primeiro presidente do Senado envolto à escândalos, tampouco o único detentor do poder lá dentro.
Poucos sabem, por exemplo, que o DEM comanda a primeira secretaria há dez dos últimos 18 anos. É ela que gerencia a maior parte do orçamento do Senado (por isso é apelidada de "cofre" da Casa). A ela também é subordinado o diretor geral do Senado (cargo que era ocupado por Agaciel Maia). Com o mínimo de investigação, com certeza muitos escândalos lá serão descobertos.
A mídia também não deu destaque ao fato de mais de 40 senadores (de um total de 81, ou seja, quase a metade) terem se beneficiados dos atos secretos editados pro Agaciel Maia.
O saldo de tudo isso é o seguinte: Sarney tem enorme responsabilidade por essa crise atual, porém não deve ser crucificado sozinho. Sua renúncia ou afastamento, embora necessários, não sanarão os males do Senado. É necessária uma investigação plena na Casa, envolvendo todos os senadores, gabinetes, diretores e funcionários. Mas, sobretudo, é imprescindível uma mudança de costumes na política brasileira. Ou seja: o problema não será resolvido tão cedo.
Sarney passou a presidir a instituição pela terceira vez (já o havia feito de 1995 a 1997 e entre 2003 e 2005) no início deste ano. Desde então, escândalos como o das passagens aéreas, do pagamento de horas extras a servidores durante as férias e do seguro de saúde (após seis meses no cargo, o senador e seus familiares são agraciados com um seguro de saúde vitalício, onerando anualmente dos cofres públicos R$17 milhões) vêm palpitando na imprensa. Mas foram os atos secretos que escancararam o tamanho da podridão que assola o Senado.
Foi a partir de então que a crise, que era da instituição como um todo, passou a ser catalisada na figura de Sarney. Fora ele quem, durante sua primeira presidência da Casa, contratou Agaciel Maia para diretor geral do Senado e João Carlos Zoghbi para diretor de recursos humanos da instituição. Desde então, os dois montaram um esquema que permitia, dentre outros, a contratação secreta de funcionários e aumento salarial (clique aqui e veja exemplo). Apelidado de "atos secretos" o esquema servia também para exonerar, sem publicidade, parentes dos senadores lotados em cargos políticos (o que configura como nepotismo cruzado). Exemplo disso é o irmão de José Sarney, Ivan Celso Furtado Sarney, exonerado do cargo de assistente parlamentar, e João Fernando Michels Gonçalves Sarney, neto do presidente, exonerado do gabinete do senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA); ambos por ato secreto.
Pouco depois, foi descoberto que Adriano Cordeiro Sarney, outro neto de Sarney, operava um sistema de crédito consignado no Senado. Por meio da empresa Sarcris Consultoria, Serviços e Participação Ltda., Adriano intermediava a concessão de empréstimo de seis bancos aos servidores da Casa.
A situação complicou para Sarney após a recente denúncia de que ele não declarou à Justiça Eleitoral uma casa no valor de 4 MILHÕES DE REAIS. Sarney comprou a casa em 1997 do banqueiro Joseph Yacoub Safra, dono do Banco Safra. Desde então, disputou duas eleições (1998 e 2006) sem declará-la. O artigo 350, presente no capítulo 2 Código Eleitoral, classifica como crime eleitoral "Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais.”
Eis a mansão:
Foi justamente por não declarar à Justiça uma mansão, no valor de R$ 5 milhões de reais, que Agaciel Maia foi afastado do cargo de diretor geral do Senado (antes mesmo do escândalo dos atos secretos vir à tona).
A mansão não declarada de Sarney é sua residência em Brasília. Mesmo assim, de 2008 a maio deste ano Sarney recebia R$3,8 mil mensais de auxílio-moradia, destinado aos parlamentares que não possuem residência fixa na capital. Ou seja: além de não declarar a mansão, Sarney ainda recebia um auxílio (equivalente a mais de 7 salários mínimos) por supostamente não morar em Brasília.
Apesar de tudo isso, Sarney declarou: "A crise não é minha". Veja abaixo trechos do discurso, feito em 16/06 na tribuna do Senado:
José Sarney está certo. Por ter presidido três vezes o Senado, ele tem a maior parcela de culpa de toda essa crise. Afinal, foi ele quem trouxe Agaciel Maia, Zoghbi, entre outros, e aparelhou a Casa de modo a possibilitar todo e qualquer desvio de ética. Porém, não deve ser crucificado sozinho pelas recentes denúncias, tampouco ser nomeado o responsável pelo sangramento do Senado. Afinal, o Senado está ferido há tempos.
Somente de 2000 para cá, foram inúmeros escândalos e dois presidentes renunciaram. Em 2001, o então presidente do Senado Jáder Barbalho (PMDB) renunciou após denúncias de corrupção e desvio de verbas, que somavam mais de R$ 3 bilhões. Em 2007, Renan Calheiros (PMDB-AL) deixou a presidência após a revelação de que pagava a pensão do filho que teve com a ex-amante Monica Veloso com dinheiro de um lobista de uma empreiteira.
Portanto, Sarney não é o primeiro presidente do Senado envolto à escândalos, tampouco o único detentor do poder lá dentro.
Poucos sabem, por exemplo, que o DEM comanda a primeira secretaria há dez dos últimos 18 anos. É ela que gerencia a maior parte do orçamento do Senado (por isso é apelidada de "cofre" da Casa). A ela também é subordinado o diretor geral do Senado (cargo que era ocupado por Agaciel Maia). Com o mínimo de investigação, com certeza muitos escândalos lá serão descobertos.
A mídia também não deu destaque ao fato de mais de 40 senadores (de um total de 81, ou seja, quase a metade) terem se beneficiados dos atos secretos editados pro Agaciel Maia.
O saldo de tudo isso é o seguinte: Sarney tem enorme responsabilidade por essa crise atual, porém não deve ser crucificado sozinho. Sua renúncia ou afastamento, embora necessários, não sanarão os males do Senado. É necessária uma investigação plena na Casa, envolvendo todos os senadores, gabinetes, diretores e funcionários. Mas, sobretudo, é imprescindível uma mudança de costumes na política brasileira. Ou seja: o problema não será resolvido tão cedo.
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