sexta-feira, 10 de julho de 2009

Governabilidade em detrimento da ética

A perene crise que assola o Senado e, em maior dosagem, o presidente da Casa, José Sarney (PMDB), colocou o PT em verdadeira saia justa. As denúncias envolvendo o ex-presidente da República (sendo a mais recente o desvio dos recursos cedidos pela Petrobrás à Fundação Sarney) exaltaram os ânimos no Senado.

Três partidos pressionam pela renúncia ou o afastamento de Sarney da presidência: DEM, PSDB E PDT. Juntos, somam 32 senadores. A esse grupo inclui-se Jarbas Vasconselos e Pedro Simon, as poucas exceções éticas do PMDB, e o também pemedebista Garibaldi Alves. Há também José Nery, único representante do PSOL na Casa. O saldo é este: 36 Senadores não compactuam com Sarney sentado na cadeira de presidente.

É óbvio que cada um tem seus interesses.

O DEM, por exemplo, foi o principal fiador da eleição de Sarney. Foram os 14 senadores do partido que possibilitaram a vitória do candidato do PMDB sobre Tião Viana, do PT, no início do ano. Além disso, Sarney tem fortes vínculos com o partido, desde o tempo em que este ainda era PFL. O DEM, agora, tenta tirar o corpo fora, jogando todo o peso da culpa sobre o presidente. Mas esse ato de traição vai mais além: é o partido quem comanda a primeira secretaria, apelidada de "cofre da Casa". Ou seja: querem usar Sarney como bode expiatório para todos os devios que o próprio partido ajudou a cometer.

Já o PSDB, além de exercer seu papel de oposição, tem outros interesses no afastamento de Sarney. O primeiro vice-presidente da Casa é, vejam só, o tucano Marconi Perillo. Se Sarney de fato se afastar, a presidência cairá de mão beijada nas mãos do PSDB. Caso renuncie, Perillo teria 5 dias para marcar novas eleições. O que a mídia não dá atenção é que trocar Sarney pro Perillo, do ponto de vista moral, é como substituir seis por meia dúzia. O tucano é alvo de quatro inquéritos no Supremo Tribunal Federal por supostos crimes cometidos quando era governador de Goiás. As acusações que recaem sobre ele deixam até Sarney no chinelo: formação de quadrilha, corrupção passiva e fraude em licitações.

Sobre Pedro Simon e Jarbas Vasconselhos não há críticas a fazer. Ambos, há tempos, têm se mostrado as raras exceções éticas no Senado e no PMDB. Já Garibaldi Alves, não é crime supor, tem como um dos motivos para pedir o afastamento o fato de ele mesmo ter sido preterido por Sarney para disputar as eleições presidenciais no início do ano (vale recordar que Garibaldi cumpriu um mandato tampão na presidência após a renúncia de Renan Calheiros).

Vamos, finalmente, ao PT. O Partido dos Trabalhadores, a mando de Lula, deixou claro que não é mais o baluarte da ética de tempos atrás.

Quando a crise estourou pra cima de Sarney, sete dos doze senadores do partido estavam inclinados a pedir o afastamento do presidente. Eis que Lula apareceu e deixou claro quem manda no partido. O presidente, então em viagem à Líbia, reafirmou seu apoio incondicional a Sarney. Até a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, foi escalada para proteger o senador.

Nos bastidores, Lula chamou sua bancada de senadores de "amadores" e ordenou o apoio a Sarney.

Pouco depois, o plenário assistiu a um visivelmente contrariado Aloizio Mercadante, líder do partido no Senado, defender Sarney na tribuna. Em sua fala, um verdadeiro desabafo do que levou o partido a cessar as críticas ao presidente da Casa:



Mercadante deixa claro o que levou o PT a reafirmar o apoio a Sarney. A frase já é clichê, mas não resisto à tentação de utilizá-la: o PT virou refém do PMDB.

No Senado, além da presidência, o PMDB possui 18 senadores. Um número extremamente valioso para que projetos de interesse do governo sejam aprovados e, acima de tudo, para barrar a oposição em questões danosas ao Planalto. Mas nem toda a bajulação que o PT faz ao PMDB impede que o aliado tome decisões contrárias aos interesses governamentais (a extinção da CPMF é o principal exemplo).

Além disso, temos as eleições de 2010. O maior temor do PT é que o PMDB apóie um candidato tucano (seja o paulista José Serra ou o mineiro Aécio Neves). Assim, o melhor aos petistas é não causar atritos com os pemedebistas.

Fora tudo isso, há o fato de, se Sarney se afastar, o PSDB ganhar a presidência do Senado.

Somando tudo, duas análises são cabíveis:

A primeira tem como parâmetro o âmbito político. Nesse quesito, não há como criticar a atitude do PT e, sobretudo, a de Lula. Politicamente falando, não há outra opção ao PT que não seja apoiar Sarney na presidência. Cai como uma luva o velho ditado: "Ruim com ele, pior sem ele". Seria nada menos que desastroso para o Planalto que um tucano presidisse o Senado em vésperas de eleições. Pior ainda seria não contar com o apoio da bancada do PMDB na obstrução das investigações da interminavelmente adiada CPI da Petrobrás (que, ao que parece, finalmente será instaurada na próxima terça-feira). Ou, em caso catastrófico, perder o apoio do partido para o PSDB. Assim, Lula tem razão ao qualificar de amadora a incipiente decisão da sua bancada de senadores de pedir o afastamento de Sarney. A imprensa tem afirmado que Lula, com toda sua popularidade, não precisa de ninguém para ter a governabilidade. Bobagem. Os 80% de aprovação popular que Lula detém de nada lhe ajudam na aprovação de projetos no Congresso.

Tendo a ética como parâmetro, porém, a atitude de Lula é decepcionante. O que dizer de alguém que 1989 não poupava críticas ao remanescente da ditadura (Sarney), e que agora lhe dá todo o apoio possível. Lula poderia dar um tácito apoio ao aliado, sem ter que passar por constragimentos, como quando argumentou que "Sarney, devido a sua biografia, não é um cidadão comum" e por isso não deveria ser julgado pela crise do Senado. É óbvio que a crise não é culpa exclusiva de Sarney, tampouco que seu afastamento irá mudar algo, mas essa defesa apaixonada que Lula faz (e obriga o PT a fazer) de Sarney tem decepcionado muito militante e simpatizante do partido. É de dar pena a desolação de Mercadante no discurso que postei acima.

É claro que nem todos do partido acataram a ordem de Lula. Os senadores Eduardo Suplicy, Marina Silva (ex-ministra do meio ambiente) e Tião Viana (que perdeu para Sarney as eleições no início do ano) continuam pedindo o afastamento do pemedebista. Mas são vozes solitárias, abafadas pelo coro partidário.

A partir de agora, o PT não irá pressionar Sarney, mas também não irá se expor na defesa do presidente do Senado. Irá agir tacitamente para mantê-lo na presidência. É uma pena que o partido, mais uma vez, tenha decidido pela governabilidade em detrimento da ética.

Um comentário:

  1. Ética, Cristiano?

    Os bons e velhos princípios de moral passam longe do conjunto executivo/legislativo/judiciario!
    O que vale agora é quem vai se dar melhor...
    Desde o século XV, com o mercantilismo e a introdução do nosso bom(fdp) sistema capitalista, acho meio perda de tempo analisar
    os trâmites governamentais pela ética..
    Vamos engolir o nosso orgulho de querer um país mais 'ético' e procurar, quem sabe, um país mais JUSTO. é um bom começo! Você mandou mto bem ao lembrar do Lula e do Sarney no ano de nosso nascimento! Que ironia do destino não é mesmo? Ontem críticas ferrenhas e hoje tapinha nas costas! pqp!

    e viva a dupla dinâmica: dem e psdb!
    lembra-me muito bebeto e romário, batman e robin, axl & Slash, arlindo cruz & sombrinha, maldini & Baresi, Edu lobo & Chico... FODA de vencer!

    attenc.

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